sábado, 21 de dezembro de 2024

VM FAZ UM TESTAMENTO

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Por: Venâncio Mondlane

Se estas forem as minhas últimas palavras, peço a todo povo Moçambicano, milhões de famílias afectadas directa ou indirectamente pela violência policial de hoje, pelo terr@rismo de Estado de quase 50 anos, para que peguem o testemunho e avancem com toda força e velocidade a caminho da coroa e do troféu da liberdade.

Gente muito poderosa tem me contactado; pessoas cuja dimensão e poder é suficiente para me fazer desaparecer com um simples sopro. Todos me aconselham a me preparar para aceitar e assumir, em silêncio, os estragos que serão causados pelos explosivos que sairão da boca da Professora Lúcia no dia 23 de Dezembro. Os poderosos dizem que em troca terei um trono secundário, mas salpicado de privilégios indescritíveis, desde que, mais uma vez, deixe a carruagem vermelha passar sem incómodos.

Perdi dois mandatos consecutivos na Assembleia da República, perdi um emprego que me dava condições afortunadas, perdi economias de uma vida nas contas bancárias bloqueadas. Vivo como o carneiro que surdo e mudo é levado impotente para o matadouro. Vivo cruzando fronteiras, em constante e permanente perigo, pairando sobre a minha cabeça um mandato internacional de busca e captura. Por onde passo procuro ser mais oculto que uma sombra, mais furtivo que o homem invisível.

Mas, mas,... tudo isso é nulo. É insignificante. É simples luxo e mimos quando comparado com as mais de 200 almas que foram apagadas pelo cano das armas da Unidade de Intervenção Rápida (UIR). Tudo Isso que digo que perdi ou que me aflige, é como quem chora porque a comida não tem sal diante um faminto, cujas lágrimas secaram, por um jejum forçado de mais de 3 dias sem nada na boca. É ficar triste por não ter uma cama medicinal perante quem tem como leito um papelão.

Tudo isso é uma nulidade e um insulto se compararmos com o Fábio que levou 6 tiros apenas por tocar panelas no interior da sua casa no Bairro Luís Cabral, na cidade de Maputo; tudo que perdi nada é, se compararmos com Celeste, nossa irmã grávida que tem um bala alojada no corpo, mas que os médicos disseram que não pode operar sob risco de ela e o bebé perderam a vida simultânea e instantaneamente!!!!!!!

Tudo quanto perdi não é nada quando comparado com os milhões de Moçambicanos que mesmo jorrando pelos seus olhos fios intermináveis de lágrimas ainda assim, de pulmões cheios e fortes, gritam: POVO NO PODER!!!!!!

Tudo quanto perdi nada é se comparado com Augusto Tausene Cumbana Júnior (Guto), miúdo de Mussumbuluco de apenas 13 anos de idade, assassinado por uma bala da UIR encravada na cabeça, deitado no colo do pai, Sr Augusto Tausene Cumbane, e este, chorando, dizia perante as câmaras de uma das televisão local: AS MANIFESTAÇÕES NÃO DEVEM PARAR!!!!!

Tudo quanto perdi é motivo de vergonha se for falado perante Reginaldo Félix Macie, filho de Félix Macie, de apenas 15 anos de idade, natural de Chibuto, que participando de uma procissão fúnebre de um empresário local chamado Azarias Moyana, morto na sua loja por uma bala da UIR, também foi alvejado mortalmente sem dó nem piedade.

Tudo quanto perdi é uma blasfémia referir perante mano Shottas que foi baleado pela UIR quando fazia uma LIVE em Ressano Garcia e as suas últimas palavras foram: FUI ATINGIDO, ESTOU A MORRER....ESTOU A MORRER....

Tudo que perdi, em fim, é teatral, é comédia, se nos lembrarmos do fatídico dia 19 de Outubro, em plena Rua da Resistência, 25 projécteis voaram com a velocidade da luz e se encravaram no corpo daquele que foi conhecido como o Advogado do Povo, Elvino Dias, cuja herança mais conhecida dele é a frase de motivação dos manifestantes:....PELA VERDADE, VAMOS ATÉ O FIM.....

Sei que tudo quando estou aqui a escrever os poderosos deste mundo podem entender como uma assinatura da minha sentença de morte. Porém, um dos versículos mais conhecidos da Bíblia é este: Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará. Venha o exército, seja declarada guerra contra nós, seja aprovada a pena capital contra nossas vidas, sejam libertos os cachorros devoradores da morte, mas, mas, mas.....mesmo que tenha que ser a minha última palavra, gritarei: QUEREMOS A VERDADE ELEITORAL.

Este País é nosso
Salve Moçambique

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